Onde está a sua força?

Eu tive muitas referências femininas ao longo da minha vida. Irmãs, mães (a original e algumas adotadas pelo coração), professoras, tias… Uma vez, passando por uma situação profissional muito difícil, liguei aos prantos pra uma delas, pedindo algum conselho, alguma luz, já que ela era um exemplo de profissional pra mim. Ela já tinha traçado o longo e árduo caminho da academia, e eu, na época, apenas começava o mestrado. Eu esperava um consolo, uma palavra de conforto, e a direção certeira para que eu saísse bem daquela situação. Mas não foi exatamente isso o que aconteceu, e eu acabei levando um susto, engolindo seco, e amadurecendo anos em apenas horas (talvez alguns dias) de reflexão.

O que aquela referência tinha me dito e causado tanto movimento interno fora: “você não tem noção da sua força!”. E não foi num tom melodramático, doce, fofo, não. Foi com braveza. Ela me disse isso como se já tivesse perdido a paciência comigo. Entendi, finalmente, que aquela situação constrangedora pela qual passei no mestrado tinha a ver com a minha ignorância em relação à minha força, com a minha teimosia em não assumi-la.

(As pessoas inseguras não gostam de mulheres fortes. As pessoas que temem perder suas posições confortavelmente garantidas por um Q.I., quem indica, ou pelo cheque gordo de algum parente rico, não gostam de mulheres que são seguras do que pensam e falam. Porque essas malditas feministas não se conformam com posições conquistadas pela generosidade de algum chefe babão. Se elas pensam diferente dele, em alguma questão de sua alçada, elas se expõem.)

O que muitas vezes acaba fragilizando essas feministas e outras mulheres fortes que não têm consciência de sua força é justamente a queda por um desejo de afirmação alheia, que parece nunca ser satisfeito. O “mundo do trabalho” não está pronto para mulheres fortes – na maioria dos lugares, seja em corporações seja na academia. E não adianta elas esperarem por discursos de reconhecimento, por aceitação imediata às suas idéias livres e interessantes, num ambiente como esse. O mundo do trabalho, dominado por homens que já nascem praticamente legitimados a serem médicos, engenheiros, administradores, economistas, professores universitários etc, não está habituado ainda a mulheres que disputam a palavra (e a liderança) na mesma medida com eles. As ferramentas (até as mais antiéticas) de gestão estão nas mãos e nas cadeias de eventos lideradas por diretores, coordenadores, donos das organizações. E são usadas para freiar a astúcia daquelas metidas à besta que “não conhecem seu lugar”.

Mas eu entendi qual é o meu lugar. Depois que tomei consciência da minha força, ou seja, das minhas qualidades profissionais reais, passei a medir melhor os momentos mais favoráveis para colocar minhas palavras e também as consequências que elas podem suscitar. Passei a ficar menos vulnerável, mesmo enfrentando as resistências usuais do “mundo do trabalho”. Mantenho um sentimento de afirmação que não depende da graça de ninguém. (O que não me impede de ter consciência também das minhas limitações… sou péssima em matemática e física, por exemplo. Se alguma pesquisa exige o conhecimento de estatística então, peço ajuda dos universitários!).

Mas, depois daquele evento difícil no mestrado e da bronca daquela mulher forte e experiente que me confrontou, entendi que o meu lugar tem que ser construído e afirmado por mim, antes de qualquer coisa. Se tornar-me mãe diminuiu ainda mais a legitimidade que certas pessoas me concedem no “mundo do trabalho” (por acharem que ainda estamos nos anos 1950, quando as esposas eram propriedade dos maridos), eu tenho plena consciência da minha força para suplantar esse desafio. Ser mãe não só me fez ter mais consciência do meu lugar profissional, como me deu mais precisão para escolhê-lo e defini-lo. Porque agora há mais alguém dependendo de mim, dependendo de minha força e exemplo de vida.

 

 Imagem: ciadefoto

Postagem anterior
Crise de identidade em gêmeos
Próxima postagem
Sobre escolhas e a capacidade materna

1 Comment

  1. Danielle Albuquerque
    10 de Janeiro de 2014 at 17:30 — Responder

    Sou outra profissional depois de ser mãe. Seu texto diz exatamente o que vivi, mas no mercado, não no meio acadêmico 🙂

Envie uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*

*

This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.

Voltar
COMPARTILHAR

Onde está a sua força?